sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Das coisas que deveria dizer, antes de te ver ir embora.





Talvez eu não queira me acomodar, mas como agir diante do conforto da minha solidão macia, de menina com voz de silêncio abafado, com bafo de mofo que repele os outros até quando não quer? Peço licença, pois se me inclino é pra alcançar as palavras que ainda me são esquivas. Na danação da minha vida, escapam escorregadias através dos dedos. Se me falta papel, me sobram as entraves ao tentar dizer. Até movimento os músculos orofaciais, mas o gelado da língua afundada na boca não favorece a tentativa. Naufragam todas as minhas falas, quando teus olhos, teimosos que são, ancoram nos meus.

De que outra forma evidenciaria, que meu coração sedado pelas tuas chegadas, vai te gritando rouco por todos os cantos da cidade, enquanto resiste roto pelas tuas esperas? Me aguarda o amor, e junto com ele o pavor da vulnerabilidade. Mas se nenhuma espera é vã, então devo mesmo é guardar o pavor pra mais tarde, pra uma outra ocasionalidade, ao invés de atirá-lo violento pra dentro dos teus braços, espatifando futuros abraços, como quem não quer amor nenhum. Sou toda ao contrário, por isso tenho procurado contornar os meus avessos, como quem ensaia na frente do espelho, um apelo mudo pra não te fazer desistir.

Tantos anos esperando a boca, que me tirasse o gosto de palavra que se perdeu. Só quem prova sabe, quão trabalhoso é tirar o azedo de papilas gustativas habituadas à ilusão. Depois de todo esse esforço, agora que (re)encontro teu gosto, ainda me faço de tola, pra depois soltar reclamações sobre o pavor em te perder. Contraditória, a mesma mente que trabalha na tentativa de ser concisa, ativa no corpo o modo de saudade de arder junto ao teu.

Ainda é cedo, encosto a cabeça no teu seio esquerdo. No que permaneço com o nariz sob teu queixo, te sinto respirar como quem gostaria de inalar todo o ar dos teus pulmões. Passado o descontentamento, transponho meus olhos das brigas tão comuns, experimentando uma felicidade maciça, talvez masoquista, de quem admite o gozo no deletério do amor. Acreditando que posso tentar te ensinar a procurar minhas vontades escondidas, por detrás dessas constantes mudanças de humor.




9 comentários:

  1. Essa agonia profunda com sentimentalismo me prendeu muito.
    Ainda li, ao som de:
    Lobão - A vida é doce

    ...dá ainda mais uma tensão nervosa, angustiante e muito bem apreciada!

    Parabéns, filha!

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  2. Que coisa linda! Cheia de ritmo. É como se as palavras cantassem com tua voz na minha cabeça.

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  3. São tantas coisas a serem ditas nesses momentos.

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  4. São milhares de sentimentos , poucos momentos , pouco espaço e pouco tempo!

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  5. Lindo lindo, tenho algo não publicado que se parece com isso.

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  6. Eu já sei que alguém vai chegar pra tirar esse gosto de ilusão, mofo e esses gostos ruins. Minha amiga me ensinou. :)

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  7. Que boniteza! "Sou toda ao contrário, por isso tenho procurado contornar os meus avessos, como quem ensaia na frente do espelho, um apelo mudo pra não te fazer desistir." Inspirador...

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